quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Para um almoço especial!




Dentre todas as massas, a que mais gosto é o gnocchi, ou, para nós brasileiros, nhoque. Carrego nas memórias de infância minha nona indo para cozinha preparar o prato para o esperado almoço de domingo com a família. Amo nhoque, adoro fazê-lo, comê-lo e reinventá-lo. Meus filhos já são experts em enrolar e cortar nhoques para me ajudar. Mas como todos os cozinheiros amadores, eu também já me apavorei com a ideia de fazer a massa em casa.
O que me incentivou a tentar pela primeira vez foi imaginar que dentre todos os tipo e formatos de massa, talvez o nhoque seja a mais fácil. Com um pouco de tempo, paciência e persistência, certamente a prática virá e você poderá tornar este prato sua especialidade, uma marca registrada. Adoraria receber uma mensagem contando que minha teoria deu certo!
            Para nos situar melhor, o nhoque foi provavelmente o primeiro formato de massa criado pelo homem. Seu nome significa “caroços”, derivando da palavra “nocchio”, nó da madeira. São pequenos e cilíndricos, sendo feitos principalmente de semolina ou farinha de trigo ou ainda pão ralado. O mais recente de todos é o de batata. Este, surgiu apenas no século 16 com a introdução da batata na Europa.
No Carnaval de Verona, desde 1531 até hoje, festeja-se o “baccanal del gnocco (singular de gnocchi)”, onde é eleito o “papà del gnocco”, que distribui nhoque entre a população. No Brasil homenageamos o prato todo dia 29. É o famoso nhoque da sorte, em que se coloca uma nota ou moeda sob o prato. Segundo a lenda, um casal de velhinhos deu um prato de nhoque a um mendigo num dia 29 e todos os três tiveram ganhos inesperados em seguida.
Tradições e lendas à parte, o consenso do nhoque perfeito é que este tem de ser leve e delicado. A maior dica para o acerto talvez seja no controle da umidade. A batata precisa ter pouca umidade, podendo ser assada (coloque-as sobre uma cama de sal grosso, faça alguns furos na casca e leve ao forno) ou ainda cozida com a casca. A quantidade de farinha utilizada também deve ser pequena e a massa não pode ser muito trabalhada, apenas o suficiente para ficar homogênea. Há ainda os chefs que aboliram os ovos da receita, o que dificulta na hora de enrolar a massa. O nhoque aparece hoje em inúmeras variações, fugindo de seus ingredientes básicos e dos molhos mais comuns: pesto, manteiga e sálvia, gorgonzola e tomate.

Nhoque da minha avó
Encha a mesa com pessoas queridas e este belo prato de massa.
- 800 g de batatas Asterix
- 1 ovo batido
- 150 g de farinha de trigo + extra para enrolar
- 1 colher de sopa de azeite de oliva
- Sal
Preparo

Pré-aqueça o forno a 200ºC. Fure com o auxílio de um garfo a casca das batatas e leve-as ao forno numa cama de sal grosso até ficarem bem macias. Depois deixe esfriarem um pouco e corta-as ao meio, retirando a polpa com a ajuda de uma colher e passando as batatas ainda quentes pelo espremedor direto numa tigela. Com uma colher de pau, misture as batatas com o ovo, a farinha de trigo, o azeite de oliva e o sal. Mexa apenas para unir os ingredientes. Numa superfície enfarinhada, despeje a massa de batatas e forme uma bola. Rapidamente divida a massa em 6 porções e faça longos rolos.
Corte os nhoques em pedaços de três centímetros. Se quiser moldar os nhoques no seu formato mais tradicional, pressione cada pedaço de massa com o polegar nas costas de um garfo. Cozinhe em bastante água. Seu tempo de cozimento é muito rápido, assim que subirem na água estão prontos. Escolha seu molho preferido e bom apetite!

Algumas outras opções que adoro
- Nhoque de queijo de cabra com cebolas caramelizadas e tomilho: 500g de queijo de cabra bem misturadas com dois ovos, sal e pimenta-do-reino. Aos poucos vá adicionando ½ xícara de farinha de trigo até conseguir uma massa que desgrude das mãos. Coloque-a 30 minutos no refrigerador. Em seguida corte e cozinhe-os. Sirva com cebolas caramelizadas e tomilho.

- Nhoque de azeitonas pretas com molho de tomates e azeitonas: 500 g de batata cozidas e amassadas bem misturadas com três colheres (sopa) de farinha de trigo e 1 ¼ xícaras de queijo parmesão. Em seguida misture com 2 e ½ colheres (sopa) de pasta de azeitona preta e uma colher (sopa) de azeitonas pretas picadas. Em seguida, corte e cozinhe os nhoques, servindo com molho de tomate com azeitonas pretas e manjericão.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Quem tem pressa, come cru!







     Que bom!!! Apesar de muitos ainda terem grande resistência em comer carne crua, temos vários apreciadores em diferentes culturas, daí pratos como o Steak Tartare francês, a Mett ou Hackepeter  alemã, o Filet Américain belga e ainda a curitibana Carne de Onça.

     Veja a diferença entre eles:

-       Steak Tartare: originalmente carne de cavalo, molho tártaro e gema de ovo. Hoje em dia é feito com carne bovina e recebe uma combinação de diferentes condimentos, como: mostarda, alcaparras, pepino em conserva, cebola, molho inglês, gema de ovo,... Sempre servido acompanhado de fritas ou salada verde.

-       Mett ou Hackepeter: carne de porco moída com sal, pimenta, alho, cebola e semente de erva doce. Servida com pão.

-       Filet Américain:  sua receita é a mesma do Steak Tartare, mas leva adição de maionese e normalmente é servida com pão.

-       Carne de Onça: é uma versão brasileira de todas as opções acima, tendo sido difundida pelos  imigrantes alemães no Sul do Brasil, principalmente em Curitiba. Seus ingredientes consistem numa mistura de carne bovina, mostarda preta, cebola, conhaque, alho, páprica, cebolinha verde, gema de ovo, ... tudo muito misturado, servido com broa úmida de centeio. Seu nome vem do péssimo hálito de seus apreciadores!




     Como adoro lendas, vamos a que explica a origem do steak tartare com mais drama,  deixando para os tártaros, povo nômade da Ásia Central que se alimentavam de carne crua, a responsabilidade de sua criação. A carne era armazenada sob o lombo do cavalo, onde o alimento durava mais e amaciava ao longo do dia. O povo da época creditava à ingestão de carne crua a grande força dos tártaros liderados por Átila, o rei dos Hunos, e começou a difundir o prato entre quem sonhava ganhar a força dos nômades.

     Outra historinha para sua  origem foi quando Kublai Khan (1215-1294), neto do grande líder Genghis Khan, invadiu Moscou, e ele e seus guerreiros introduziram a carne moída de cavalo aos moscovitas, que tempos depois foi chamada de steak tartare.


     Agora vamos aos fatos reais:  primeira descrição do Steak Tartare foi dada por Jules Verne em 1875 no seu livro Michael Strogoff.

     Mas foi apenas em 1926, quando o molho tártaro foi incorporado à carne, por Joseph Niels do Restaurante Le Canterbury em Bruxelas, que surge o Filet Américain. A receita rapidamente cruza a fronteira da Bélgica com a França, mas só ganha fama mundial depois da guerra, quando turistas americanos descobrem o prato na Europa.

     O nome na França passa a ser Steak Tartare, que deriva da expressão "à la tartare",  servido com o conhecido molho tártaro.

     A Mett ou Hackepeter e a Carne de Onça não tão famosas, acabaram por não ter nenhuma lenda envolvendo sua origem. Nem eu encontrei qualquer informação para enriquecer meu texto.

     Então volto para o steak tartare, um "old-fashion" dentro do mundo da gastronomia, totalmente anos 80 que teve sua primeira nova interpretação nos arredores de  1990 pelas mãos do francês Jean-Georges Vongerichten, quando este trocou a carne bovina pelas beterrabas.

     Depois rapidamente surgiram os tartares de atum, salmão, tomate, carneiro, abacate com caranguejo, ...e por aí um universo sem fim de criatividade!!!

     Passou alguns anos esquecido, voltando recentemente aos cardápios dos grandes restaurantes. Nos Estados Unidos é possível encontrá-lo em diferentes versões, temperado com canela no Annisa em NY, com gengibre, semente de mostarda e picles de pêra no Joule em Seattle, no Takashi em NY, de wagyu com shoyo, alho, miso e óleo de gergelim, ... e por aí vai. Já no Brasil, temos um restaurante em São Paulo, do chef Erick Jacquin, especializado neste prato, é o Tartar&Co, onde serve até pastel recheado com tartare.




     Este prato utiliza carne de gado crua picada na faca (originalmente, é claro), podendo ser filé mignon, coxão mole, miolo de alcatra, patinho ou qualquer corte de carne que não apresente muita gordura. A tradição pede que seja "picada na ponta da faca", tratando a carne com muita gentileza, mas muitos discordam que o tempo de contato da mão com a carne, pode ser mais romântico, mas acaba esquentando a carne sendo mais rápido e eficaz o uso do moedor. Aqueles nem tão preocupados assim com a temperatura da carne vão até de pilão e almofariz.

     Atualmente qualquer prato que utilize a carne, peixe e até mesmo frutos bem  picados e servidos crus, são chamados de tartares.

     Combinações que prometem dar certo:

-       Salmão + anchovas + alcaparras + ovos cozidos
-       Atum + avocado + shoyo
-       Tomate + pepino + queijo feta
-       Vieiras + abobrinhas + miso + shoyo

 Na escolha das receitas para hoje, só poderia ir de Carne de Onça, afinal nem todos os dias encontro uma receita curitibana dando sopa!




Carne de Onça

Ingredientes

-       500g de patinho picado na faca
-       1/2 cebola roxa bem picada
-       1/2 cebola branca bem picada
-       1 dente de alho bem picado
-       1 colher de sopa de conhaque
-       1 colher de sopa de mostarda Dijon
-       1 colher de chá de páprica doce
-       1 colher de chá de molho inglês
-       2 colheres de sopa de alcaparras picadas
-       2 gemas
-       sal e pimenta Tabasco a gosto
-       1 xícara de cebolinha verde fatiada bem fininha
-       5 fatias de broa

Preparo

Coloque a carne numa tigela sobre outra tigela com cubos de gelo e um pouco de água. Em seguida adicione todos os ingredientes à carne, reservando metade da cebolinha verde para utilizar depois. Ajuste sal e pimenta e sirva em seguida sobre a broa. Decore com a cebolinha verde restante.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Que bom que não tinham mariscos!







                 La nascita di Venere, 1484 circa.
                     Alessandro Botticelli


            ... ricordata dal Vasari nel 1568, con la Primavera, nella villa di Castello, la tela il cui tema fu commissionata da Lorenzo di Pierfrancesco de'Medici, cugino del Magnifico e raffigura l'approdo di Venere, nata dal mare, sull'isola di Cipro, ove la sospingono i venti Zefiro e Aura, e dove l'accoglie l'Ora che le porge un manto fiorito...


            Retratada no quadro acima, Afrodite, deusa grega da beleza e do amor, que para os romanos era Vênus, nasceu dentro de uma concha de vieira, tendo sido gerada pelas espumas do mar. E por acompanhar a deusa do amor, acredita-se que a concha tenha poderes de fertilidade. 

            Bom, melhor deixar arte para quem entende e ir para minha história. Verão a toda, sol sem trégua, hora de comprar os mariscos direto da fonte. Lá vai meu marido caminhar seus 5 km, morro acima, morro abaixo, para voltar com meus 6kg de moluscos embaixo do braço. Plano perfeito de um almoço longo e preguiçoso. Quase perfeito...pois, o pescador, já muito amigo, informa que não tem nenhum marisco sequer. Com olhar de "cachorro magro" e imaginando minha cara quando voltasse para casa de mãos vazias, ele lança aquela pergunta básica, e agora? Vim de longe, caminhando no sol, minha mulher ... minha mulher...minha mulher me mata se eu não levar nada. Foi aí que surgiu o pote ou pacote de vieiras frescas no fim do arco-íris para fazer nossa alegria.





               As coquilles são conhecidas no Brasil pelo nome de vieiras, moluscos bivalves da família Pectinidae com conchas em formato de leque, encontrados nas águas relativamente profundas do Atlântico. Um molusco de carne branca (músculo adutor), rodeado pelo órgão reprodutor (gônada), que chamamos de coral, ambos utilizados para consumo. É o único molusco bivalve que consegue nadar, abrindo e fechando as conchas rapidamente.
Para se lembrar da concha, é só ver a logomarca dos postos de gasolina da Shell. Existe também a vieira de baía, comum na costa leste dos Estados Unidos, que é a concha símbolo do estado de Nova Iorque.





       As vieiras não são muito comuns em nossos cardápios, ou não eram, pois parece que estes dias estão chegando ao fim. Lentamente surgem em apresentações modernas e criativas.


       Os motivos que as afastaram das mesas dos restaurantes, foram seu alto custo e a dificuldade de abastecimento. A escassez de fornecedores nacionais nos levou a depender de importações chilenas e canadenses, que nem sempre chegam com regularidade e possuem altos preços. Mas nos últimos anos o cultivo de vieiras se desenvolveu bastante, principalmente em Porto Belo e Florianópolis em Santa Catarina, no litoral norte de São Paulo e na Baía de Ilha Grande no Rio de Janeiro.

         As vieiras mais saborosas são as de tamanho médio (3 a 4cm), com sabor adocicado e textura delicada. Não suportam o cozimento longo, pode-se dizer: "Quando você pensar que elas estão prontas, já passaram do ponto". Muitas receitas indicam marinar as vieiras, se o fizer, não esqueça de secá-las muito bem antes de usar. E para realçar o sabor sutil das vieiras, sugiro pelo menos o uso de um destes três ingredientes mágicos: manteiga, limão ou flor de sal. 






         Diferente das ostras, que duram até 3 dias, as vieiras morrem poucas horas após a retirada do mar, precisando ser transportadas em tanques de água. Então preste sempre atenção em seu frescor ou prefira as congeladas.


         Podem ser comidas cruas, recheadas com raiz forte, mergulhadas no leite de coco, apenas seladas na manteiga, em molhos de curry e capim limão, acompanhadas de pimentas, amêndoas, erva-doce, ... mas sua versão clássica, ainda é uma das minhas favoritas, a famosa receita francesa de Coquille Saint-Jacques.

        

         Não tenho como falar das vieiras, sem lembrar que sua concha é o símbolo do apóstolo Tiago e muito popular entre os peregrinos do Caminho de Santiago de Compostela na Espanha. Eles a utilizam em símbolos fixados nas roupas e chapéus ou ainda a própria concha que quando apresentada nas igrejas e castelos do caminho é garantia certa de comida. Eram atribuídos à concha poderes milagrosos, um amuleto contra maldições e pragas.


         Não sei se acredito em seus poderes de fertilidade ou nos milagrosos, mas na dúvida, tenho sempre minhas conchas guardadas nem que seja com o único intuito de poder degustar toda a doçura desta suave iguaria.







Coquille Saint-Jacques
Na França o molusco recebe o mesmo nome da receita.



Ingredientes
  • 500g de vieiras
  • 7 colheres de sopa de manteiga sem sal
  • 200g de cogumelos Paris fatiados
  • 1/2 cebola bem picada
  • 3 colheres de sopa de sherry seco
  • 1 colher de sopa de suco de limão
  • 3 colheres de sopa de farinha de trigo
  • 2 xícaras de leite
  • 2 gemas de ovo
  • 1/4 de xícara de creme de leite fresco
  • 1/4 de xícara de panko ou farinha de rosca grossa (feita com pão italiano)
  • 1/4 de xícara de queijo Gruyère ralado 
  • Sal e pimenta do reino
Preparo

Lave e enxugue bem as vieiras. Tempere com sal e pimenta do reino moída na hora. Numa frigideira funda bem quente coloque duas colheres de manteiga e sele rapidamente as vieiras. Retire e reserve. Adicione na mesma frigideira duas colheres de manteiga, a cebola picada e em seguida os cogumelos e salteie rapidamente. Adicione o sherry e o suco de limão. Tempere com sal e pimenta moída. Retire tudo da frigideira e deixe descansar junto com as vieiras. Ainda na mesma panela, derreta três colheres de manteiga e coloque a farinha de trigo. Mexa sem parar com um fuet (batedor de arames). Adicione o leite e continue mexendo até ferver. Numa tigela misture as gemas com o creme de leite. Coloque um pouco do molho quente na mistura de gemas e creme mexendo fortemente,  e em seguida misture tudo na frigideira com o molho. Quando engrossar, ajuste sal e pimenta e adicione os cogumelos e as vieiras. Coloque nas próprias conchas das vieiras ou em ramekins cobertos com o panko e o queijo. Leve ao forno para gratinar e sirva em seguida.